sexta-feira, 11 de setembro de 2009

ÍNTEGRA DO ACÓRDÃO DO TRE-RS


TRIBUNAL REGIONAL ELEITORAL
RIO GRANDE DO SUL
Coordenadoria de Taquigrafia e Acórdãos
PROCESSO PC 102
PROCEDÊNCIA: UNISTALDA
RECORRENTE: MOIZES SOARES GONÇALVES
RECORRIDA: JUSTIÇA ELEITORAL
---------------------------------------------------------------------------------
Recurso. Prestação de contas. Eleições 2008.

Desaprovação. Ausência de abertura de conta bancária específica e emissão de recibos
eleitorais.

Impõe-se a rejeição das contas quando as irregularidades constatadas impossibilitam o
controle efetivo da origem e a aplicação dos recursos de campanha do candidato.

Provimento negado.

A C Ó R D Ã O

Vistos, etc.

ACORDAM os juízes do Tribunal Regional Eleitoral, à unanimidade, ouvida a Procuradoria Regional Eleitoral e nos termos das notas taquigráficas inclusas, negar provimento ao presente recurso.

CUMPRA-SE.

Participaram do julgamento, além do signatário, os eminentes Desembargadores Luiz Felipe Silveira Difini – vice-presidente, no exercício da Presidência – e Marco Aurélio dos Santos Caminha, Drs. Lúcia Liebling Kopittke, Ana Beatriz Iser, Ícaro Carvalho de Bem Osório e Desa. Federal Marga Inge Barth Tessler, bem como o douto representante da Procuradoria Regional Eleitoral.
Porto Alegre, 10 de setembro de 2009.
Dr. Jorge Alberto Zugno,
relator.
PROCESSO PC 102
RELATOR: DR. JORGE ALBERTO ZUGNO
SESSÃO DE 10.9.2009

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto por MOIZES SOARES GONÇALVES, prefeito eleito no Município de Unistalda, contra decisão do Juízo da 44ª Zona Eleitoral – Santiago, que desaprovou suas contas. A sentença rejeitou as contas do candidato, em face da
infração de um conjunto de normas legais, dentre as quais: art. 3º; art. 10;
art. 15, IV; art. 17, § 2º; art. 18; art. 22, § 3º, da Resolução n. 22.715/08 do
TSE, ressaltando a ausência de declaração de despesas de sua campanha com combustível e material de publicidade, as quais teriam sido apontadas na prestação de contas do comitê financeiro do partido.

Em suas razões recursais, sustenta que o juízo a quo teria aprovado com ressalvas as contas, tendo em vista a referência ao art. 40, II, da Resolução n. 22.715/08 do TSE, no dispositivo da sentença. Em razão disso, não caberia a remessa de cópia do processo ao Ministério Público Eleitoral para os fins previstos no art. 22 da LC 64/90. Em relação às falhas propriamente ditas, referiu que não comprometem a regularidade da prestação. Nesta instância, foram os autos com vista à Procuradoria
Regional Eleitoral, que exarou parecer pelo desprovimento do recurso.

É o relatório.

O recurso foi interposto dentro do tríduo legal, portanto tempestivo, razão pela qual dele conheço. Na certidão da fl. 75, há menção a que o documento da fl. 74
não foi apresentado em sua forma original. Efetivamente, compulsando o instrumento de mandato à fl. 74, verifico que se trata de cópia desprovida de autenticação.
Entretanto, não me parece ser falha que prejudique a representação do causídico ou demande diligência, máxime a natureza administrativa do procedimento em tela.
Equivoca-se o recorrente ao asseverar que a sentença teria aprovado as contas do candidato com ressalvas. Uma simples leitura da decisão do juízo a quo demonstra que
as razões de decidir orientaram-se no sentido da rejeição das contas. Aliás,
houve integral acolhimento do parecer conclusivo do órgão técnico (fls. 49/54),
que opinou pela rejeição. Constou na sentença (fl. 63v): “A presente prestação
de contas, pois, nos termos do parecer conclusivo é flagrantemente irregular”.
Assim, inequívoco que o fato de ter constado o art. 40, II, da Resolução n. 22.715/08 do TSE (aprovação de contas com ressalvas), e não o art. 40, III (desaprovação de contas), do mesmo dispositivo, deu-se por mero erro de digitação.

Omissão de declaração de receitas e despesas de campanha

O recorrente declarou ter arrecadado recursos no montante de R$ 2.571,91 (fl. 08), relativamente a toda sua campanha como candidato à eleição majoritária no Município de Unistalda. Instado a prestar esclarecimentos (fl. 44), o candidato aduziu
que as despesas de sua campanha com combustível e material publicitário (placas, bandeiras, adesivos, panfletos) foram declaradas na prestação de contas do comitê financeiro de sua campanha e que eventuais dúvidas poderiam lá ser sanadas.
Mais, asseverou o recorrente (fl. 47): “A prestação de contas do candidato a Prefeito confunde-se com a prestação de Contas do Comitê Financeiro e lá está as notas de despesas de combustíveis conforme a Legislação eleitoral vigente”.

Na mesma petição, o candidato listou inúmeras despesas que não constaram na sua prestação de contas, perfazendo um total de R$ 8.754,50, quantia que representa mais de 3 vezes o que foi declarado como arrecadado (R$ 2.571,91 – fl. 08). Fundamenta seu agir na atribuição do comitê financeiro de encaminhar a prestação de contas do candidato a prefeito (art. 7º, IV, da Resolução n. 22.715/08 TSE, c/c o art. 19 da Lei n. 9.504/97).

Sem razão.

Admite-se que o encaminhamento das contas seja feito pelo comitê financeiro, o que não significa dizer que o candidato esteja desobrigado do dever e da responsabilidade de informar à Justiça Eleitoral todos os valores que foram utilizados em sua campanha, independentemente da origem, ou seja, ainda que tenham sido repassados pelo comitê financeiro.

Sobre o tópico, a lição de Rodrigo López Zilio 1:

Em verdade, a responsabilidade pela elaboração da prestação de contas é do próprio candidato, seja o cargo majoritário, seja o cargo proporcional; o encaminhamento da prestação de contas à Justiça Eleitoral é que será efetuado através do comitê financeiro, no caso de candidato à majoritária, e através do comitê financeiro ou do candidato, no caso de candidato a proporcional. Com efeito, como o candidato é o responsável – em solidariedade com o administrador financeiro – pela veracidade das
informações financeiras e contábeis de sua campanha, elementar que a
elaboração da prestação de contas seja de sua responsabilidade, embora o encaminhamento seja feito pelo comitê financeiro.

Pela propriedade com que foi asseverado, reporto-me aocontido na sentença às fls. 62/63:
(...) a prestação de contas de qualquer candidato deve refletir objetivamente
todas as receitas e despesas da campanha, que, por evidente, não pertence ao Comitê Financeiro, mas sim ao candidato. O candidato, por isso, tem o dever de informar à Justiça Eleitoral todos os valores que foram utilizados na sua campanha, independentemente da origem, ou seja, ainda que tenham sido repassados pelo Comitê Financeiro.

O Relatório de Receitas e Despesas deve, portanto, consignar todos os repasses feitos à campanha do candidato pelo Comitê Financeiro, bem assim a destinação dada aos recursos. Não fosse desta forma e se se admitisse que apenas o Comitê Financeiro
informasse os repasses, sequer necessário seria que o candidato prestasse contas da campanha. Bastaria que declarasse receitas e despesas inexistentes.

Assim, totalmente descabida a pretensão do recorrente no sentido de que o órgão técnico deveria ter analisado em conjunto a prestação de contas do candidato e a do comitê financeiro, pois são obrigações distintas e prestadas em processos autônomos.
O recorrente deveria ter declarado, na sua prestação de contas, recursos que alega ter recebido como doação proveniente do comitê financeiro, consoante determina o art. 15, IV, da Res. n. 22.715/08 do TSE, verbis:
Art. 15 – Os recursos destinados às campanhas eleitorais, respeitados os
limites previstos nesta resolução, são os seguintes:
(...)
IV – doações de outros candidatos, comitês financeiros ou partidos políticos.
De igual forma, deveria ter emitido recibo eleitoral, a fim de
tornar legítima a arrecadação, requisito imprescindível para toda a doação feita
a candidato, ex vi do que dispõe o art. 3º da resolução antes mencionada:
Art. 3º - Os recibos eleitorais são documentos oficiais que viabilizam e
tornam legítima a arrecadação de recursos para a campanha,
imprescindíveis seja qual for a natureza do recurso, ainda que do próprio
candidato, não se eximindo desta obrigação aquele que, por qualquer
motivo, não disponha dos recibos.

Aliás, a própria arrecadação de recursos e a realização de gastos por candidatos e comitês financeiros só poderão ocorrer após a obtenção dos recibos eleitorais, sob pena de desaprovação das contas (art. 1º da Res. n. 22.715/08 do TSE).
Mais, essa alegada arrecadação financeira deveria ter circulado pela conta bancária especificamente aberta para fins eleitorais, o que também foi descumprido pelo recorrente, consoante disciplina o art. 10 da Res. n. 22.715/08 do TSE:
Art. 10 - É obrigatória para o candidato e para o comitê financeiro a abertura de conta bancária específica para registrar todo o movimento financeiro da campanha, inclusive dos recursos próprios dos candidatos e dos oriundos da comercialização de produtos e realização de eventos, vedado o uso de conta bancária preexistente.
Sobre o tema, colho em Rodrigo López Zilio, na obra antes citada (pp. 345/346).

Essa exigência do legislador tem em vista criar um mecanismo que facilite fiscalização dos valores arrecadados para a campanha eleitoral, evitando
que haja aporte ilícito de recursos em benefício de determinados
candidatos, com prejuízo ao equiíbrio do pleito. Somente é possível
proceder a arrecadação de recursos após a abertura da conta bancária
específica, sob pena de rejeição de contas. Todo e qualquer recurso
arrecadado deve, necessariamente, transitar pela conta bancária específica,
ainda que o recurso seja proveniente do próprio candidato ou decorrente de
comercialização de produtos e serviços (...). A conta bancária é destinada
única e exclusivamente para movimentação financeira da campanha
eleitoral (...). O uso de recursos financeiros para pagamento de gastos
eleitorais que não provenham de conta específica importa a
desaprovação das contas do partido ou candidato. (Grifei.)

A situação, para dizer o mínimo, é inusitada, pois o recorrente
inicialmente refere que arrecadou R$ 2.571,91 (fl. 08). Ao depois, relaciona
despesas equivalentes a mais de 3 vezes o arrecadado - R$ 8.754,50 (fls. 47/48), alegando ter recebido valores do comitê financeiro. Destarte, a prestação de contas em análise não espelha a realidade contábil da campanha realizada, comprometendo sua regularidade, confiabilidade e consistência.


Registro que é de minha relatoria o recurso da prestação de contas do comitê financeiro do PP de Unistalda - PC 625. Trata-se de comitê financeiro com atribuições relativas às eleições de prefeito e vereador – único. Compulsando-o, verifiquei que no Demonstrativo de Doações Efetuadas a Candidatos, documento no qual deveria estar arrolada a alegada doação ao ora recorrente, encontra-se a seguinte informação: Sem Movimentação. Assim, o documento declara não ter sido feita doação alguma à campanha do recorrente. Logo, ainda que se pudesse confrontar e implementar um certo caráter complementar da prestação de contas do comitê financeiro em relação
à prestação ora em exame, não há uniformidade entre a versão do recorrente e
aquela apresentada documentalmente pelo próprio comitê financeiro.

Assim, não se sabe quanto o recorrente arrecadou, tampouco a origem desses recursos, muito menos quais foram realmente os seus gastos na campanha para o cargo de prefeito no Município Unistalda. Desta forma, a desaprovação das contas impunha-se como consectário lógico-jurídico - aliás, como concluiu o órgão técnico e o douto juízo a quo.

Nesse sentido é o entendimento jurisprudencial:

RECURSO – PRESTAÇÃO DE CONTAS – ELEIÇÕES 2004 CANDIDATO A PREFEITO – RECURSOS MOVIMENTADOS PELO COMITÊ FINANCEIRO – FALTA DE ABERTURA DE CONTA BANCÁRIA E AUSÊNCIA DE EMISSSÃO DE RECIBOS ELEITORAIS – IRREGULARIDADES QUE IMPOSSIBILITAM O CONTROLE EFETIVO DOS RECURSOS DE CAMPANHA DO CANDIDATO –REJEIÇÃO DAS CONTAS – DESPROVIMENTO.

Impõe-se a rejeição das contas quando as irregularidades constatadas impossibilitam o controle efetivo das fontes de financiamento e aplicação dos recursos de campanha do candidato, inviabilizando o reconhecimento da legalidade das contas, como é o caso dos registros da movimentação financeira efetuados juntamente com os do comitê financeiro, da não emissão de recibos eleitorais para as doações e da não-abertura de conta bancária pelo candidato. (Grifei.) (TRE/SC, Acórdão 2056, julgado em 7 de junho de 2008.)

Mais recentemente:

PRESTAÇÃO DE CONTAS DE CAMPANHA – ELEIÇÕES 2008 – FALTA DE ABERTURA DE CONTA BANCÁRIA DE CAMPANHA – MOVIMENTAÇÃO FINANCEIRA QUE SE REALIZOU ATRAVÉS DA CONTA DO COMITÊ FINANCEIRO – IMPOSSIBILIDADE DE AFERIÇÃO DA REGULARIDADE DAS CONTAS – RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. (TRE/SC, Acórdão 23464, julgado em 11de fevereiro de 2009.)

Por último, registro o valoroso auxílio prestado pela Secretaria de Controle Interno e Auditoria desta Corte, no que tange à ciência contábil, ramo do conhecimento subsidiário na formação do convencimento do julgador.

Com essas considerações, VOTO pelo conhecimento do recurso e, na questão de fundo, pelo seu desprovimento, ao efeito de manter a decisão hostilizada, que desaprovou as contas de MOIZES SOARES GONÇALVES, candidato eleito ao cargo de prefeito do Município de Unistalda.
É o voto.


(Todos de acordo.)


DECISÃO

À unanimidade, negaram provimento ao recurso.