sexta-feira, 18 de março de 2011

A legitimidade dos leitores e a tentativa de controle da mídia digital em Santiago

Sociedade e Diversidade
O recente debate presidencial envolvendo Serra e Dilma, abriu um pertinente debate sobre o limite da intervenção da imprensa, os condicionamentos que existem por trás da informação e a extensão da atuação da mídia, portando-se como partido político e tentando monopolizar a assim chamada opinião pública.

Nunca esse debate foi tão oportuno e, no nosso contexto microcósmico, porém, não desligado do macro, de nossa cidade e região, ele cresce e carece de alguns elementos para serem jogados no debate.

Segundo Paul A. Palmer, autor do clássico Public Opinion in Political Thoery, in Essauys In History an Political Theory, Harvad University Press, Cambrige, “o conceito de opinião, em ciência política, é um dos mais complexos, senão o mais". Essa de Palmer tornou-se clássico sobre o assunto nos anais da comunicação moderna inglesa, francesa e, sobretudo, alemã.

Palmer afirma: “as obras sobre democracia no século XX estão repletas de complicadas racionalizações do comportamento político com referência a opinião pública, não havendo unanimidade quanto ao seu significado ou função".

Entretanto, esse debate não é recente. Se formos buscar as raízes na Grécia Antiga e em Roma, veremos que os filósofos e teóricos greco-romanos já falavam em “consenso populi” . O mesmo raciocínio estava presente nos discursos da escolástica, com o adágio “Vox populi vox dei”, aludindo ser a voz do povo a voz de Deus. Aliás, o próprio Maquiavel, em DISCURSOS, comparou a voz do povo a voz de Deus. Na Inglaterra, o filósofo Alexandre Pope asseverou: “estranha é a voz do povo e não é a voz de Deus”, em tom sarcástico.

Entretanto, é só mesmo com Jean-Jaques Rosseau, na França, no período revolucionário e de luzes, que se abre um discussão sobre “opinião pública como participação popular na criação e controle, execução e crítica das diretrizes políticas”. De certa forma, todo o debate atual passa por Rosseau. Atualmente, não são poucos os autores abordando esse tema e Pierre Bordeaux aprofundou o assunto à exaustão.


Professor Wanderley Guilherme dos Santos
 A entrevista publicada tempos atrás em meu blog com o Professor Wanderley Guilherme dos Santos, um dos mais preparados teóricos brasileiros da atualidade, sabidamente social/democrata, observa a facilidade que a imprensa tem de criar crises em países com renda inferior a 30 mil dólares e observa “em todos os países (com renda superior a 30 mil dólares), a imprensa não tem esta capacidade de criar crises políticas, como tem nos países da América Latina”.

Quando cursei meu pós-graduação em produção textual, no curso de Letras, na disciplina Análise do Discurso, tão bem ministrada pela professora Mestre Sandra Oliveira, tive a oportunidade de analisar alguns editoriais e entre eles, cito excertos de um, deixando de citar o veículo por razões éticas, aqui nesse post, posto que naquela ocasião, em sala de aula, apresentei as fontes:

“ o senado da República ... traiu a nação...”
“ assumiu uma posição que contraria o desejo da sociedade...”
“ o senado sai desaprovado pela opinião pública...”
“ está derrotado pela sociedade...”.

Esse veículo invocou para si à condição de arrogar-se intérprete da opinião pública, sem o menor pudor. Emitiu juízos, julgou, tripudiou e falou em nome da sociedade, sem ao menos definir a que sociedade se refere. Trata-se de uma pretensão monumental, um veículo de comunicação invocar para si à condição de juiz da opinião pública, tentando falar em nome da sociedade como um todo e mais ainda, invocando a dita reprovação da nação.

Pela não uniformização do pensamento
Um jornal, uma rádio, uma rede de TV, enfim, qualquer que for o veículo de comunicação, tem – sim – a legitimidade de uma parcela da opinião pública, justamente aquela que o legitima com assinaturas, anúncios e interação dentro de sua área de influência. E quanto maior for o número de assinantes e anunciantes maior é a influência desse veículo. Existe uma relação e um processo interativo entre as comunidades da sociedade com o veículo e a partir daí pode-se, sim, aceitar a influência de algum veículo na sociedade e tal constatação é perfeitamente factível, aceitável e de fácil assimilação.

Agora, inaceitável, arrogante e altamente pretensiosa é a intenção de tornar-se um dado veículo como investido – num pastelão messiânico/jornalístico – de porta voz da opinião pública como um todo. A própria facilidade como é emitido tal conceito, sem qualquer rigor científico-metodológico, apenas adstrito a chavões, epítetos, mais uma vez acena no rumo da irresponsabilidade. Só numa terra de cegos, de idiotas, um conjunto de chavões e aleivosias dessa natureza passa sem críticas e questionamentos. Ou estão achando que todos são otários?

A cidade de Santiago quer gostem ou não os conservadores, é uma cidade que começa a ter ares universitários, onde os blogs têm sacudido o conservadorismo, onde a informação flui, onde existem pessoas críticas, onde temos pessoas inteligentes na imprensa, nos nossos centros de saberes e na produção teórica local. Esse movimento e essa unidade, embora não conjugando de unicidade formal, acaba resultando num senso crítico de bom nível, onde se edita o contraditório, onde se esboçam posições críticas e, finalmente, onde está emergindo um movimento teórico-cultural de uma certa vanguarda, livre, sem tutelas e fruto da mais livre expressão das nossas inteligências.

Melhor exemplo disso ocorreu nessa semana, onde metade do auditório da URI se posicionou abertamente contra o substitutivo Aldo Rebelo, a despeito do peso maciço das oligarquias agrárias  rurais, seus prepostos e seus representantes.

Esse movimento explosivo de liberdade blogueira e twitteira (entre outras redes sociais) que invadiu Santiago nos últimos dois anos, puxado por jovens de uma geração teen, e outras idades, alimentado por talentos extremamente incipientes, mas nem por isso menos despreparado, é um fato auspicioso, revelador de talentos e, sobretudo, formador de uma parcela de opinião pública local. O outro lado desse movimento, é que a edição do contraditório está na hora, em cima do fato, brotando espontaneamente da liberdade jovem. Por mais que setores, entre eles as universidades, tenham sido alvo de algumas críticas, é necessário compreender essa emersão de opinião, pois dela pode resultar um consenso fantástico no sentido da formação de uma cidadania crítica, não manipulável e, sobretudo, lúcida e participativa.

Eu sou um blogueiro e não reivindico o monopólio da verdade, não quero falar em nome da opinião pública, não tenho interesses outros a não ser minhas próprias liberdades de expressão e opinião.  Essas, não são facilmente catalogáveis e nem querem o esquadrinhamento de serem perfilados dentro de uma sistemática de enquadramentos. Por tudo, nossa cidade e região precisa refletir sobre a emergência desse movimento digital jovem, mas também abrigante de várias outras faixas etárias. Nunca os blogs foram tão lidos, nunca se levou tão a sério um movimento e esse fato veio para ficar e errado estará quem não entender as razões da liberdade de cada um abrir seu blog e falar dos seus medos, de suas inquietações e de suas angústias. Afora a psicanálise coletiva no divã da sociedade, os blogs vão incomodar muita gente, puxar muitas orelhas conservadoras e cometer muitos erros e imprudências. Mas nenhuma delas a ponto de arrogarem-se os donos da opinião pública e as parteiras da vontade da sociedade.

Por fim, essa investida em cima dos meus anunciantes, nessa semana, patrocinada pelos senhores do agronegócio, que ainda pensam em controlar tudo em Santiago; esses, esquecem-se que a blogosfera e a internet não se prestam para cabrestos. Existe uma parcela expressiva da opinião pública de Santiago que lê meu blog, assim como outras tantas do Estado, do país e do mundo. São esses segmentos que me dão legitimidade e mais: o conhecimento que adquiri, esse ninguém tira de mim. Ninguém me inviabilizará, mesmo que a vontade desses conservadores conseguisse um boicote total contra meu blog, ainda assim eu criaria uma trincheira sozinho e buscaria uma moblização em cima dos meus milhares de leitores.

A sociedade santiaguense não vai apoiar - unânime - o substitutivo Aldo Rebelo sobre o novo código florestal. O consenso está quebrado, as opiniões divididas e tudo será assim daqui para frente. O contraponto foi editado e todos já reconhecem a força da blogosfera opinativa e que ajuda na edição do contraditorio, sem a pretensão de falar em nome do povo, de Deus ou de quem quer que seja. Apenas pugno pelas luzes, pelas reflexões e pela inclusão cada vez maior de nossa sociedade na sociedade do futuro, na sociedade do conhecimento e da informação.