quarta-feira, 18 de maio de 2011

Pensar Santiago

O trabalho do censo do IBGE, versão 2010, já terminado, computados os dados, abre-se um pertinente debate. O que houve com Santiago que ficamos com 49.071 habitantes?

A rigor, nada de extraordinário. Estamos estabilizados? Pode ser que sim. Os elementos de análises jogados no debate apontam facilmente as razões das correntes migratórias negativas, as positivas e o debate sobre a migração pendular não foi considerado, o que, pessoalmente, considero um erro.

Teria inúmeros casos para exemplificar e particularizar o debate, não o faço, contudo, para não nivelar as análises a particularidades, mas reafirmo e sustento que precisaria ser feito uma média entre o número de eleitores inscritos na zona 44ª entre os períodos recenseados.

Senão vejamos o caso de Santiago, em particular:

Em 2000, com uma população de 52.138 habitantes, tínhamos 34.986 eleitores inscritos. Em julho de 2007, com uma população de 49.558 habitantes, tivemos 37.599 mil inscritos. Agora, pelo censo do IBGE/2010, a população diminuiu mais ainda, ficamos com 49.071 habitantes, mas os eleitores inscritos continuam crescendo, sendo que o TRE-RS sustenta (dados do último pleito) que temos 38.781 eleitores aptos a votar no municipio de Santiago.

Trata-se de um caso raro em que o número de habitantes diminui e o número de eleitores aumenta.

Sei que existem explicações sociológicas para a migração pendular, mas no nosso caso, não estou convencido. Mas como sou apenas um blogueiro e as autoridades são bem conhecidas e seus castelos todos sabem onde ficam, o assunto é para eles. Entretanto, como todos são cegos, ouso dizer que precisamos aprofundar o debate, afinal temos fatores estruturais e conjunturais que incidem em nossas análises.

Primeiro, não podemos esquecer que Santiago insere-se num contexto de estrutura fundiária singular. Integramos a metade sul-pobre do Estado, onde não existem investimentos industriais, estamos demasiadamente longe dos centros produtores, não temos infraestrutura. Ademais, estamos inseridos num contexto de predomínio de mentalidade latifúndiária, seguido de uma gama de médias propriedades, onde as pessoas desenvolveram uma linha de pensamento de identidade de classe, o que explica que o pequeno proprietário familiar (aquele como até 50 hectares e mão-de-obra empregada familiar ) pensa como o grande proprietário, não desenvolvendo, assim, uma identidade de camada, de estamento. Pelo contrário, criou-se uma identidade de setor, altamente perniciosa. Fatores endógenos também pesaram nesse processo, a diminuição do contingente militar, a saída de empresas como a Karbain, Jussal, Braspelco, entre outras.

Nesse contexto, deve ser situado o boom gerado a partir de expectativas de transformarmo-nos em pólo regional e centro universitário, no final, não confirmadas. É a velha história que apregoávamos que haveria uma bolha de consumo imobiliário dado a grande presença de estudantes de outras regiões. O que está se vendo, salvo melhor juízo, é que tal não se confirmou e a presença do ensino virtual acabou deixando as pessoas em suas casas e a presença de universidades federais, públicas e gratuitas, em várias cidades vizinhas, São Borja, Itaqui, Alegrete, Uruguaina, IFETs... deslocou nossa intenção de 4 ou 5 anos atrás. Entretanto, não é bom Santiago abdicar dessa pretensão de pólo educacional superior regional e mesmo com as adversidades, oriundas das politicas públicas federais para a educação superior, é necessário manter o debate.

Pensar Santiago como um todo implica em pensar a correlação das forças produtivas e uma interação com o setor público. Qualquer tentativa de industrialização deve passar, necessariamente, pelo envolvimento de uma matriz econômica local, agregando matéria-prima local e gerando um entorno produtivo.

É um erro crasso, por exemplo, comparar Santiago com Jaguari, conquanto se tratam de realidades distintas. Não se pode comparar um município agrário como Jaguari, com quase 90% de seu PIB vindo do setor primário e com uma base física assentada em pequenas propriedades familiares. E não se pode ignorar que a pujança dessa reside justamente na desconcentração fundiária e na diversificação da produção. Em Jaguari não existem monoculturas dominantes e pari passu ao predomínio de uma larga diversificação produtiva.

Em Santiago, ocorre o contrário, especialmente fora da pequena faixa de colonização italiana, eis que predomina uma mentalidade de grande produção, espírito monocultural e concentração fundiária. E, a rigor, se trata de um paradoxo, afinal temos, hoje, 1677 propriedades até 100 hectares, contra 331 até 500 hectares e 104 propriedades acima de 500 hectares. Nosso rebanho bovino, alvo de controvérsias, chega a quase 300 mil cabeças.

Já a produção agrícola de Santiago, segundo o censo Agropecuário do IBGE-2004, teríamos o seguinte quadro:

Arroz, área plantada de 50 hectares.

Feijão, área plantada de 350 hectares.

Fumo, área plantada de 90 hectares.

Milho, área plantada de 4.000 hectares.

Soja, área plantada de 16.000 hectares.

Trigo, área plantada de 3.500 hectares.

Uva, área plantada de 25 hectares.

Esses dados e índices refletem bem o que venho sustentando num debate de tolos que insistem em negar a própria essência das estatísticas. O que explica a vasta área cultivada de milho, soja e trigo? Do ponto de vista do valor agregado da atividade econômica fica claro que a agropecuária representa exatamente o dobro da indústria e do comércio juntos, contudo, exceto isso, vê a problemática concentração monocultural. A rigor, desconfio dos índices oficiais, mas eles servem de indicativo. Quem observar tais produções e quem se deter na análise dos números do censo agropecuário não encontra produção de hortifrutigranjeiros, parecendo até que não consumimos tomate, alface, cebola, rúcula, batatas, repolho, rabanete, nabo, mandiocas ... Se fossemos uma sociedade séria, abriríamos um pertinente debate sobre esses indicadores e tentaríamos subverter essa lógica piramidal absurda.

Ademais, se analisados os índices pecuários strictu, temos quase 6 cabeças de vaca/boi para cada habitante de Santiago, no entanto, não temos nenhuma cadeia produtiva que gere um entorno dos derivados bovinos. O mesmo raciocínio vale para o rebanho ovino, caprino e até para frangos/frangas e codornas. Como 90% das mulheres santiaguenses usam bolsas de plásticos, as 10% restantes usam bolsas de couros produzidas em São Paulo. Preciso dizer mais? Nem estou falando nas chinesas imitações de Victor Hugo e outras que abundam grosseiramente.

Não existe uma política municipal de incentivo a pequenas empreendimentos e é voz corrente na cidade o despautério da concepção fiscalista (federal, estadual e ambiental) que sabidamente inibe esse setor produtivo menor. Perseguir botecos, cabeleireiros, pequenos serralheiros, ferreiros, lavagens, oficinas, enfim, perseguir essa gente é um erro.

O que se vê, ao ensejo da análise dos números, que a intervenção no domínio econômico foi tímida e não tivemos capacidade de produzir alternativas endógenas de desenvolvimento. Nem a URI,  nem nossos políticos e nem esse centro empresarial faz-de-conta foram capazes de foram capazes de estabelecer e fomentar as bases de um projeto sólido, agregador de valores e gerador de entornos. E não que não tenhamos carne, leite, couro, lá, banha, ovos, para tal. O que existe é um conservadorismo incrível que não permite a consecução de tais políticas e o próprio ex-Prefeito Chicão, apesar de lutar por um quadro econômico diverso, notou que padecemos da ausência de fomento, de teóricos e até de propostas e debates. Trata-se de um problema grave de mentalidade. E isso chega a chocar, pois, de um outro lado, os indicadores sociais são altamente vantajosos para Santiago e os números, finalmente, não mentem e as estatísticas do IPEA.

Assim, os dados fornecidos pelo IPEA, Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, um órgão do Governo Federal, e fornecidos com periodicidade de 10 anos, indicam uma tendência boa em nossos índices municipais. As informações de 1991 e 2000 (últimos dados oficiais consolidados) de cada município do RS, em comparação com o total do Estado e o total do Brasil.  São apresentados indicadores de indigentes, pobres, dependência das transferências governamentais, índices de desigualdade social, rendimentos do trabalho e renda per capita. Por curiosidade, vejamos alguns dados:

Indigentes em Santiago, percentual sobre a população total:

1991.........................11.73%

2000...........................7.60%

2010...........................6.78%

Refere-se ao percentual de pessoas com renda domiciliar per capita equivalente a 1/4 do salário mínimo. O universo de indivíduos é limitado àqueles que são membros que vivem em domicílios particulares permanentes. Houve redução, portanto.

Pobres em Santiago, percentual sobre a população total:

1991........................37.13%

2000........................23.02%

2010........................26.76%
fonte: IBGE/CENSO/2010

Trata-se de um percentual de pessoas com renda domiciliar per percapita equivalente a 1/2 do salário mínimo. O universo de indivíduos é limitado àqueles que vivem em domicílios particulares permanentes.

Índice de Desigualdade Social de Gini

1991........................0537

2000........................0569

2010........................041  (sendo o índice inferior de 039 e o limite superior de 042. IBGE/2010).

Fonte: IBGE, Censo Demográfico 2000 e Pesquisa de Orçamentos Familiares - POF 2002/2003.
NOTA: A estimativa do consumo para a geração destes indicadores foi obtida utilizando o método da estimativa de pequenas áreas dos autores Elbers, Lanjouw e Lanjouw (2002).

Esse índice mede o grau de desigualdade existente na distribuição de indivíduos segundo a renda domiciliar per capita. Seu valor varia de 0, quando não há desigualdade (a renda de todos os indivíduos tem o mesmo valor), a 1, quando a desigualdade é máxima (apenas um indivíduo detém toda a renda da sociedade e a renda de todos os outros indivíduos é nula).

Índice de Desigualdade Social L de Theil

1991...............................0.507

2000...............................0.576

2010...............................0.512

Esse índice mede a desigualdade na distribuição de indivíduos segundo a renda domiciliar per capita. É o logaritmo da razão entre as médias aritmética e geométrica das rendas individuais, sendo nulo quando não existir desigualdade de renda entre os indivíduos e tendente ao infinito quando a desigualdade tender ao máximo. Para seu cálculo, excluem-se do universo os indivíduos com renda domiciliar per capita nula.

Renda Per Capita de Santiago

1991.............................189.73

2000.............................304.66

2010..............................falta

Mede a desigualdade na distribuição de indivíduos segundo a renda domiciliar per capita. É o logaritmo da razão entre as médias aritmética e geométrica das rendas individuais, sendo nulo quando não existir desigualdade de renda entre os indivíduos e tendente ao infinito quando a desigualdade tender ao máximo. Para seu cálculo, excluem-se do universo os indivíduos com renda domiciliar per capita nula. O aumento considerável da renda per capita santiaguense indica melhoria na qualidade de vida.

Rendimentos do Trabalho - % sobre renda total

1991...............................82

2000...............................70.1

2010...............................68.9

Mede a desigualdade na distribuição de indivíduos segundo a renda domiciliar per capita. É o logaritmo da razão entre as médias aritmética e geométrica das rendas individuais, sendo nulo quando não existir desigualdade de renda entre os indivíduos e tendente ao infinito quando a desigualdade tender ao máximo. Para seu cálculo, excluem-se do universo os indivíduos com renda domiciliar per capita nula. Uma queda expressiva.

Saindo, agora, dos dados do IPEA e adentrando nos dados estatísticos da FEE-RS, observando nosso PIB municipal, constatamos uma progressão, fato auspicioso, enquanto outros municípios sabidamente perderem no seu produto interno bruto.


PIB DE SANTIAGO

2001...............................4.258

2002...............................4.576

2003...............................5.328

2004...............................5.834

2005...............................6.435

2006...............................7.276

2007...............................8.643

2008...............................9.324

Em suma, os indicadores sociais de nossa cidade e município parecem indicar uma política acertada pelo executivo municipal. Eu não tenho a menor dúvida de que os indicadores sociais de Santiago apenas relacionam-se com a adoção de políticas sociais fortes e investimentos em qualidade de vida, como o Criança Feliz, Viva a Vida, Forma e Saúde, Minha Casa, Bola Pro Futuro, programas de saneamentos nos bairros, PSFs, bom desempenho na saúde e na educação, corroboram com esse entendimento. Contudo, a mesma performance não se observa no campo econômico, visto que as políticas de intervenção para subverter a lógica instituída não depende apenas e tão somente do Executivo municipal. Isso depende de articulação, de grupos de pressão da sociedade civil e de quebra do conservadorismo. A URI devia iniciar esse debate, uma vez que boa parte dos nossos políticos não consegue vislumbrar tais oportunidades. E como tudo se encaminha para a eleição municipal de outubro de 2012, a oposição santiaguense poderia dar uma boa contribuição ao debate, especialmente oferecendo alternativas ao debate e não sendo pautada pela própria situação.